Um lar para um amigo fiel
- Victoria Vianna
- 28 de dez. de 2020
- 6 min de leitura
Atualizado: 8 de jan. de 2021
A necessidade da compra responsável e a importância da adoção de cachorros

Não é raro encontrar pessoas que consideram seus animais de estimação como parte da família. Atualmente, segundo dados do Instituto brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 44% dos entrevistados vêem seus animais como se fossem filhos. Vale ressaltar que, a maioria das pessoas que possuem essa opinião são mulheres de até 40 anos. Não só isso, os dados ainda afirmam que 64% destas pessoas deixam seus cães dormirem dentro de casa ou até mesmo em suas camas.

Logo, pets estavam expostos em vitrines como mais uma mercadoria, enquanto os sites de vendas anunciam: "à pronta entrega!" "Temos de diversas cores!". O veterinário e vereador Rodrigo Goulart, eleito em 2016, contou que é necessário haver um equilíbrio entre compra e adoção. O político do Partido Social Democrata (PSD) possui o projeto de lei 01-00035/2019, que tramita atualmente na Câmara Municipal. O projeto, apesar de não proibir a venda em si, demanda que os lugares de venda de animais também tenham um espaço para adoção. “É importante a posse consciente do animal e que a pessoa possa optar comprar de uma criação regulamentada e fiscalizada ou de uma adoção de alguma entidade que tenha essa preocupação dos resgates dos animais”.
Goulart afirma que é necessário uma fiscalização dos criatórios e canis já que é preciso saber a origem dos animais. “As pessoas vão muito pelo preço e não pela qualidade, então eu, como veterinário, vejo o lado da qualidade dessa criação”. O vereador ainda salienta que os animais são uma questão de saúde pública, por isso defende a construção de hospitais públicos focados neste quesito. “Pelos nossos cálculos, prevemos cerca de 6 ou 7 novos hospitais e eu tenho certeza que vai acontecer, vou trabalhar todo o meu mandato para que isso aconteça” foram as palavras de seu discurso na Cãominhada, um encontro entre donos e seus pets, que também promoveu exames de mama em cadelas — por conta do outubro rosa —, Registro Geral do Animal, com direito à plaquinha para coleira e uma feira de adoção promovida pelo Abrigo CoraCão.

Quando se fala em adoção de animais, um nome se destaca dos demais. A ativista Luisa Mell já resgatou diversos cachorros que sofriam maus tratos em canis clandestinos, estes que tinham como objetivo final a venda de filhotes. Através de suas denúncias, a ex-apresentadora de TV conseguiu com que uma das maiores redes de Pet Shop do Brasil parasse de vender animais. A Petz, que não tinha conhecimento de onde seus animais eram trazidos, rompeu a ligação que tinha com os antigos canis que forneciam estes animais.
Em um dos maiores resgates já feitos pelo instituto da ativista, foram salvos 1500 cachorros que viviam em meio a muita sujeira, fezes, água suja e sem alimentação. Segundo relatos da própria Luisa Mell, os cachorros ficavam presos em gaiolas e os que nasciam com algum tipo de deficiência eram incinerados, embora o local não tivesse autorização para cremar os animais. Foi necessário alugar galpões para poder abrigar todos os cães, e a ativista contou com ajuda de celebridades para reforçar o ato da adoção.
A empresa de comércio eletrônico OLX, conhecido por sua diversidade em produtos à venda, possui mais de 17 mil anúncios relacionados a comercialização canina apenas na Zona Sul e mais de 9 mil na Zona Leste do estado de São Paulo. A artesã Mirian Oliveira, 35 anos, é uma das pessoas que optou pela compra ao invés da adoção. “Acabei não pesquisando muitos lugares, mas foi por um anúncio da internet que cheguei até o local” disse Mirian. Sua preferência pela compra, se deve ao fato de que tinha prioridade por uma raça mais calma — no caso dela, o shih tzu — e que se adaptasse melhor tanto a apartamento e crianças, já que ela possui filhos. A artesã também declarou que não pretende ter outros cachorros, pois acha que é um grande comprometimento, uma vez que o vínculo criado com o animal é muito profundo.

Ainda assim, segundo o IBGE, cerca de 90% dos seus entrevistados têm vontade de comprar ou adotar um cão. Por este motivo além de tantos canis que promovem a venda, também existem inúmeras ONGs de resgate animal que têm como finalidade as feiras de adoção.
Em um evento promovido no estacionamento do Mooca Plaza Shopping pelo Instituto Luisa Mell, a veterinária Marina Passadore, que também atua no instituto da ativista, relatou que há um policiamento antes que os animais sejam adotados, analisando, até mesmo, as condições psicológicas do adotante. Além disso, procura-se saber como é o espaço para manter o animal em segurança, nas melhores condições de existência para um animal de determinado porte e raça. Outros lugares já diferem desta política, como é o exemplo do Abrigo CoraCão, que procura saber outras características da pessoa, como provar ser maior de 21 anos e obter um comprovante de residência.

No entanto, ambas as ONGs acompanham os cães após a adoção. Segundo Marina, o Instituto tem uma equipe específica para fazer ligações e manter contato por WhatsApp com os adotantes, solicitando fotos e vídeos do animal com frequência, além de realizar visita surpresa na casa dos adotantes para conferência da situação dos animais. Em contrapartida, o engenheiro ambiental e fundador do Abrigo CoraCão, Thadeu Hiroshi, diz que a ONG acompanha cerca de 400 cães adotados e assegura que se não tiver dentro dos padrões, eles buscam de volta.
Lamentavelmente, cerca de 20% dos que são adotados voltam para o abrigo. Ainda assim, tais pets possuem a chance de serem adotados novamente, pois as feiras de adoção seguem, principalmente em shopping centers ou espaços terceirizados, geralmente em parceria com as ONGs. O Instituto Luisa Mell dispõe da opção de se comunicar através do e-mail e o Abrigo CoraCão através do WhatsApp e, após passar por uma entrevista, a pessoa pode visitar a sede de ambas as ONGs para conhecer os animais.
Márcia e Ellen Araújo que são adotantes possuem algo em comum: também são donas de Pet Shops. Márcia tem mais de 8 cães, e levou 5 consigo para a Cãominhada — Pietra, Ferrari, Amora, Nina 1 e Nina 2. A adotante nos contou que sempre teve cachorros, e largou o emprego aos 20 anos para trabalhar com banho e tosa, “eu tinha uma cachorra, e tinha dó de deixar nos lugares”. Por conta do seu trabalho com banho e tosa, acabou herdando um de seus cachorros “uma cliente que faleceu e pediu para deixar comigo caso alguma coisa acontecesse com ela” relatou mostrando a sua segunda cadela chamada Nina.
Além de ser dona de PetShop, Ellen também é protetora independente. O primeiro cachorro que resgatou foi vítima de estupro por um morador de rua, outros 3, ela salvou depois de serem atropelados. Após o resgate, o animal é castrado, vacinado e é feito uma divulgação até conseguir um adotante. Em algumas ocasiões, Ellen decidiu ficar com o cão, mas por estar traumatizado, teve de ser conquistado aos poucos para que ele se acostumar com o novo lar.

O dono do Abrigo CoraCão reforça a ideia de que não gosta muito do termo protetor, mas sim cuidadores, pois segundo ele quando você ama um animal, não ama só o seu, mas sim todos os que estão a sua volta. Thadeu também diz que todos podem fazer a diferença quando o assunto são animais em situação de abandono, inclusive juntar um grupo de amigos, arrecadar ração e fazer um mutirão de castração com animais da própria rua. É importante destacar que para manter um cão é preciso ter estabilidade financeira. Outro dado do IBGE afirma que 82% dos proprietários são de classe AB, sendo que 59% moram em casas. Desta forma, Thadeu deu uma dica para quem sente vontade, mas não tem condições para isso: “quem não puder apadrinhar sozinho, é só juntar um grupo de alunos, cada um dá 10 reais por mês e apadrinham um cão no abrigo”.
Todos os entrevistados dizem que são contra a venda não regulamentada. Márcia, dona do Pet Shop, nos contou que apenas um de seus cachorros foi comprado, porque estavam o vendendo na feira, mas que é contra o fato de quererem adotar apenas vira-lata. "Têm raças que são diferentes, combinam mais com algumas famílias, então, infelizmente, a pessoa não vai te dar" disse. Inclusive, Mirian Oliveira, que comprou seu cão exatamente por ser mais calmo, afirmou que é necessário a compra responsável dos animais, já que as pessoas precisam cuidar como se realmente fosse um membro da família, pois estes animais também possuem necessidades, ficam doentes e precisam de atenção. Ellen Araújo relata que não é contra a compra de animais e que seu primeiro cachorro foi comprado pelo seu pai, mas que não faria como sua amiga que pagou 8 mil reais em um cão . "Com 8 mil reais, castro muito cachorro e ainda arrumo um lar. Hoje em dia, não compraria um cachorro, mas não sou totalmente contra quem compra. Acho que se a pessoa pelo menos puder ajudar uma ONG já seria interessante”. Matéria produzida com Rabech Oliveira, Alex Maniezo e Ellen Fraioli.
Comentários